A seguir serão apresentadas algumas das doenças
mais comumente observadas em quelônios tanto os de cativeiro doméstico como os
de zoológicos.
Vale salientar que o diagnóstico e o tratamento
devem ser feitos por profissionais veterinários especializados em animais exóticos.
Assim, ao perceber as alterações, sintomas, mudanças de comportamento leve seu
animal mais rápido a este profissional, não havendo disponibilidade deste leve
ao veterinário para proceder uma avaliação.
Este conteúdo visa somente pontuar tais doenças
a título de informação, assim como, os tratamentos propostos.
Os quelônios que se encontram contemplados com este
conteúdo são das espécies Trachemys
sp. (tigre-d’-água), Hydromedusa
sp. (cágado-pescoço-de-cobra), Phrynops
sp. (cágado-de-barbicha), Podocnemis sp.
(tartaruga-da-amazônia e tracajá) e os jabutis da espécie Geochelone sp.
FATORES PREDISPONENTES A DOENÇAS INFECCIOSAS
Quanto mais jovem o quelônio
mais susceptíveis a doenças e maior o índice de mortalidade.
• Temperatura ambiente - Frequentemente entre 26º a 30º,
não devendo ser constante em todo o ambiente, apresentando uma variação
espacial e temporal que permita opção por parte do animal.
• Fotoperíodo – É o tempo de exposição à luz. Quando
se encontra inadequado acarreta alterações metabólicas.
• Estresse - Adequar o ambiente às necessidades
da espécie provendo assim conforto biológico. Condições inadequadas de
manutenção em cativeiro acarretam depressão do sistema imunológico.
•Recinto inadequado - Água, substrato, calor e
umidade favorecem a proliferação de microorganismos.
• Traumatismos - Muitas vezes ocorrem por
tentativas de fuga e contenções físicas inadequadas; lacerações e hematomas
também podem estar presentes.
Ressalta-se que a grande
maioria das enfermidades e de óbitos em répteis de cativeiro são decorrentes de
um manejo incorreto, englobando os aspectos de luminosidade, temperatura,
alimentação e umidade.
PRINCIPAIS
ENFERMIDADES ENCONTRADAS
a) Dermatites
As Infecções superficiais,
tanto de bactérias como de fungos (figura 1), em carapaça e plastrão são frequentes e
normalmente estão associadas ao manejo e condições ambientais incorretos.
Podendo ocorrer descoloração e desprendimento das placas córneas do casco.
Procede-se como forma de
tratamento o debridamento (remoção de tecido da ferida) dos tecidos necrosados
e a retirada das placas córneas soltas, aplicação de anti-sépticos como
iodopovidona (PVPI tópico), nitrofurazona e creme com antibiótico e
antifúngico.
Administração de antibiótico sistêmico e
tratamento de suporte devem ser instituídos nos casos graves. Aliado a tudo
isso deverão ser corrigidas as eventuais falhas de manejo como piso abrasivo,
umidade excessiva, temperatura desconfortável, má nutrição e estresse.
b) Pneumonia
Pode ser dividida em primária
e secundária a outras doenças concomitantes ou mesmo à imunodeficiência do
animal.
Nas pneumonias as bactérias
gram-negativas são os agentes mais comuns por conta de serem habitantes normais
do trato respiratório desses animais, seguido dos vírus, fungos e parasitas.
Em muitos casos os sinais
clínicos apenas são percebidos quando a doença se encontra em um nível avançado
sendo o prognóstico desfavorável. Entre os sinais incluem-se apatia
(desanimado), letargia (estado de inconsciência), mucosas cianóticas
(azuladas), dispneia (esforço ao respirar), respiração com a boca aberta,
cabeça e pescoço distendidos, chiado ao
respirar, secreção nasal e perda de equilíbrio na água em cágados.
Como forma diagnóstica o uso
da radiografia é bastante válido e lavados traqueobronquiais poderão ser
efetuados com o intuito de identificação do agente infeccioso.
O tratamento consiste na
administração prolongada de antibióticos, principalmente, contra agentes
gram-negativos, associado a um tratamento de suporte, como temperatura
ambiental adequada, fluidoterapia e alimentação por sonda gástrica, caso
necessário.
Deve proporcionar o aquecimento do animal (28 a
30ºC), garantir um nível de água em que o animal consiga apoiar as patas no
fundo e ficar com a cabeça fora da água.
c)
Salmonelose
Tem-se sugerido que grande
parte dos répteis, senão todos são portadores assintomáticos de Salmonella sp., mas isso apenas tende a
ocorrer para animais em cativeiro porque os de vida livre até então examinados
não apresentaram tal bactéria em sua flora normal. Ela pode ser encontrada nas fezes, na urina, nos ovos, na carne dos animais portadores podendo causar graves doenças.
Quando um animal encontra-se sob estresse ou doente, a resistência do animal diminui e a bactéria torna-se patogênica para o quelônio.
Sugerindo-se que o isolamento
deste agente está relacionado com as condições de manejo impostas aos animais.
Devido ao seu potencial zoonótico, ou seja, de transmissão aos seres humanos
preconiza-se a adoção de medidas de higiene como forma de profilaxia (medidas
preventivas para preservar a saúde).
Muito cuidado deve ser dispensado às crianças ao manipularem os animais para que elas possam lavar bem as mãos e objetos que entrarem em contato com o quelônio.
d)
Distocia – dificuldade na postura de ovos
Está dividida em obstrutiva e
não obstrutiva. A primeira resulta de alguma alteração anatômica que impeça a
saída dos ovos do sistema reprodutor e também da cloaca. Já a não obstrutiva
ocorre por manejo inadequado para com os animais. Por exemplo, a ausência de
local próprio para postura, temperatura ambiental inadequada, desnutrição,
desidratação e sedentarismo da fêmea que pode vir a prejudicar o tônus muscular
do oviduto.
Como sinais clínicos da
distocia a fêmea poderá apresentar anorexia (diminuição ou perda da apetite),
letargia, apatia, inquietação, comportamento de cavar o ninho, edema (inchaço)
e paralisia de membros pélvicos.
Para o diagnóstico é
imprescindível a efetuação de exame radiográfico aonde serão contabilizados o
número de ovos e o seu aspecto, ou seja, presença de casca delgada ou grossa
(FIGURAS 1 e 2).
O tratamento para os casos não
obstrutivos é o aquecimento do animal e a aplicação de gluconato de cálcio com
dextrose 5% inicialmente por via intramuscular, caso não haja resultado aplica-se
ocitocina, mas com extrema cautela. Já para os casos obstrutivos o procedimento
é cirúrgico com efetuação de cesariana ou ovariohisterectomia (retirada
cirúrgica dos ovários e útero), se necessário.
FIGURA
2: Radiografia dorso-ventral em exemplar da Ordem Chelonia evidenciando
a presença de quatro ovos no sistema reprodutor.
Fonte:www.rarerehab.org
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FIGURA
3: Radiografia látero-lateral em exemplar da Ordem Chelonia evidenciando a
presença ovos no sistema reprodutor.
Fonte:
http://www.testudines.org/
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e)
Prolapso de pênis ou Parafimose
O prolapso acontece quando há
queda ou deslocamento de um órgão que sai de sua posição natural. O prolapso de
pênis acontece com frequência em quelônios. Ao machos em idade reprodutiva iniciam suas tentativas de acasalar com
fêmeas ou até objetos como pedras, troncos, também acontece quando banhados em
água morna, ao receber caricia no plastrão, virado de costas, é comum que
ocorra a exposição do órgão com retorno completo para dentro da cloaca em até
10 minutos, caso exceda esse tempo o pênis pode entrar em contato com solo, pedras,
cimento, pode sofrer traumas que causará inchaço comprometendo seu
recolhimento. Se mantiver esse edema por tempo prolongado pode causar
diminuição do sangue no órgão levando a necrose (morte do tecido).
Ainda,traumas penianos,
separação forçada durante a cópula, infecção peniana, deficiência muscular ou
neurológica do músculo retrator do pênis ou em esfíncter cloacal, impactação da
cloaca por uratos e tenesmo (espasmo do esfíncter) são as causas mais comuns
para a ocorrência desta enfermidade.
Para prolapsos recentes recomenda-se um
tratamento conservador que consiste na limpeza, aplicação de compressas frias
para reduzir o edema, lubrificação e reposição do pênis para dentro da cloaca
novamente, com posterior sutura em bolsa de tabaco para evitar reincidências, a
qual deverá permanecer até que o pênis tenha retornado ao seu tamanho normal.
Mas quando já existem sinais de necrose no órgão prolapsado o tratamento deve
se consistir em cirurgia de amputação (penectomia) Figura 4.
1) Paciente na primeira consulta com pênis necrosado; 2)
Anestesia epidural; 3) Pênis já removido; 4) Paciente acordando da
anestesia.
Figura
4:
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f)
Prolapso de cólon
Tal enfermidade pode ser
resultante de uma constipação, tenesmo, diarreia, cálculo cístico, enterite
bacteriana ou parasitária.
Em casos ocorridos
recentemente existindo ainda a vitalidade do órgão poderá ser efetuado uma
lubrificação, massagem com aplicação de solução hipersaturada de açúcar nos
casos de edema, e a reversão do segmento com aplicação da sutura em bolsa de tabaco.
Mas em casos em que já existe necrose do cólon a cirurgia de ressecção é o
único procedimento preconizado.
g)
Prolapso de oviduto
Geralmente ocasionado por
distocia (postura difícil) e tenesmo. Como forma de tratamento segue-se o mesmo
protocolo descrito para o prolapso de cólon.
h)
Prolapso de bexiga urinária
Decorre da presença de cistite
ou cálculo cístico. Como forma de tratamento segue-se o mesmo protocolo
descrito para o prolapso de cólon.
i)
Hipovitaminose A
É ocasionada por alimentações
inadequadas em cativeiro levando a uma metaplasia escamosa (degeneração dos
epitélios) e hiperqueratose dos epitélios, principalmente respiratório e
ocular.
Os sinais são os mais diversos
e dentre eles cita-se a presença de anorexia, conjuntivite, blefaroedema
(inchaço das pálpebras) (FIGURA 5), blefarite (inflamação das pálpebras),
doenças do trato respiratório, abscessos aurais (ouvido) (FIGURA 6) e
ressecamento dos olhos pela falta de produção de muco.
O diagnóstico deve se basear
na anamnese, para se ter conhecimento da dieta oferecida ao animal, bem como
nos sinais clínicos e na resposta ao tratamento instituído. Esse tratamento
deve se basear na aplicação intramuscular semanal de vitamina A injetável,
durante duas a três semanas. E estando aliada a uma melhora na dieta animal,
oferecendo itens ricos em vitamina A como folhas verdes escuras, cenoura,
mamão, ou outras frutas vermelhas ou laranjas, por apresentarem beta-caroteno,
que é o precursor dessa vitamina.
Ressalta-se também a importância de que altas
doses de vitamina A são tóxicas a esses animais, ocasionando uma
hipervitaminose iatrogênica (erro médico), e tendo como sinais o desprendimento
de escamas nos membros e pescoço, eritema (pele avermelhada) e vesículas.
FIGURA
7: Crescimento anormal de casco em exemplar da Ordem Chelonia em decorrência de
excesso de fósforo e deficiência de cálcio em sua dieta.
k)
Fraturas de casco
Frequentemente ocasionadas por
atropelamento, mordidas de animais domésticos ou quedas de alturas
significativas. Podendo atingir a carapaça (FIGURA 8), o plastrão e as pontes,
ou até mesmo as três estruturas em conjunto.
Devem ser consideradas e
tratadas como feridas abertas, devido à contaminação bacteriana secundária, ao
menos que a intervenção clínica tenha ocorrido até seis horas após o incidente
traumático.
Existem vários métodos para o
reparo desse casco, podendo-se utilizar placas ortopédicas, cerclagens (sutura
com fio de aço inoxidável), parafusos,
resina epóxi (FIGURA 9), entre outros. Esta última quando aplicada gera uma
reação que fornece calor, portanto deve-se atentar para promover o esfriamento
da mesma no intuito de não se produzir outras complicações no animal.
Como tratamento inicial deve-se proceder no
debridamento e lavagem com solução
fisiológica 0,9% da área afetada para a retirada de eventuais células mortas,
aplicação antimicrobiana tópica para então realizar a coaptação das partes
fraturadas. A estabilização correta é fundamental para promover a formação de
uma adequada consolidação óssea, a qual poderá levar até anos para sua total
cicatrização dependendo da extensão da lesão.
FIGURA
8: Indivíduo da espécie Geochelone
sp. apresentando traumatismo em carapaça com exposição de parte óssea.
FIGURA
9: Indivíduo da espécie Geochelone sp. após a efetuação dos procedimentos de
reparo de carapaça com aplicação de resina epóxi.
l)
Doença cutânea ulcerativa sistêmica
É ocasionada pela bactéria
gram-negativa Citrobacter freundii.
Acometendo principalmente os quelônios de água doce sendo altamente contagiosa.
Os sinais característicos são
as hemorragias e ulcerações cutâneas, anorexia, letargia, perda de unhas e
dígitos. O tratamento consiste na aplicação de PVPI tópico nas lesões,
administração de antibióticos sistêmicos como o cloranfenicol, melhoria na
qualidade da água aonde se encontra o animal e um suporte nutricional. Caso os
animais acometidos não sejam tratados a mortalidade poderá chegar a 100% dos
casos.
m)
Hipoproteinemia
Ocorre devido a uma
alimentação inadequada, tendo como sinais a anemia, palidez, anorexia, apatia e
depressão. O tratamento consiste na melhoria da condição alimentar chegando a
casos em que se faz necessário efetuar alimentações via sonda esofágica.
Como medida preventiva o
conhecimento da biologia e da fisiologia da espécie em questão permitem programar
melhor uma dieta correta para a idade do quelônio.
N)
Choque hipoglicêmico
Acomete principalmente animais
submetidos à superpopulação no recinto, elevando o nível de estresse, ou devido
a uma frequência muita intensa de capturas e manipulação e também pela
utilização de fármacos anestésicos, principalmente no inverno quando os níveis
de glicose se encontram baixos.
Os sinais são midríase pupilar
(dilatação da pupila), tremores musculares, incoordenação motora, hipocalcemia
e redução do metabolismo levando a um colapso da circulação periférica.
Como tratamento deve-se repor
fluido aquecido acrescido de glicose para o animal acometido.
Material extraído do documento: MEDICINA
E MANEJO DE RÉPTEIS Elaborado por: Profª Luana Célia Stunitz da
Silva – Médica Veterinária. Site: www.conhecer.org.br